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Book Review Portuguese(Português)

Mãe só tem uma, mas quantas mães cabem dentro de uma mãe só?

2021 Korean Literature Review Contest

by Juliana Berlim , on September 14, 2022

  • Portuguese(Português)
  • Korean(한국어)

Com quantas braças se mede a extensão da dedicação materna? Os desvelos, as abnegações, as renúncias consideradas imanentes à vivência da maternidade? Contudo, quem dimensiona, no mesmo patamar, a mãe em sua grandeza simbólica para a família e em sua existência autônoma do tecido familiar? Kyung-sook Shin procura, em seu romance polifônico, desenhar os emaranhados caminhos do coração que, em um dia de verão na estação de Seul, se perdem com o paradeiro da Mãe que se desvencilha da companhia do Pai e caminha errante pelas ruas da capital sul-coreana.

O sumiço da mãe é o disparador de um corolário de memórias. A memória é a grande personagem do livro. A mãe, usualmente grifada com maiúsculas, seja na sua forma regular, seja no epíteto amoroso, Mamãe, é a força motriz da família, a pessoa que ordena o espaço familiar que observamos ao longo da narrativa. Ela é a geradora das memórias afetivas de todos, como a ancestral sempre presente – o pai, inconsequente, abandona o lar de tempos em tempos em busca de aventuras de todo tipo e até mesmo substitui a esposa por uma nova mulher, que ele coloca dentro de casa, retirando a mãe de sua residência própria – e sua força de trabalho ininterrupta e seu otimismo constante marcam a vida de todos os familiares. Ela, como depósito das lembranças familiares, é justamente a pessoa acometida por uma doença degenerativa que não se esclarece durante o fio narrativo, mas que, desconfia-se, pelo perfil dos sintomas, tratar-se de Alzheimer. Ela, o livro de ouro onde se escreveram cinquenta anos de histórias de uma família sul-coreana do pós-Guerra da Coreia, por causa de pequenos derrames e perda da memória, se desliga da razão de seu existir, sua família, de modo extraordinário. Seu desparecimento, com a imprecisão sobre a morte ou não da pessoa desparecida, lança (finalmente) luz sobre uma mulher que tentara, a todo custo, se anular em razão dos cuidados com a família, principalmente com relação aos filhos, mas também em torno do marido, um homem resmungão e inútil dentro de casa, que vivia sob os cuidados da esposa como se fosse um filho honorário (nem mesmo arroz ele sabia cozinhar sozinho, embora fosse um velho septuagenário).

Existem muitas discussões entrelaçadas no livro sobre a figura da mulher na sociedade sul-coreana. Ao final da narrativa, a culpa de todos os familiares com o leve desprezo com que sempre trataram a mãe é sintetizada na viagem da filha escritora, Chin, ao Vaticano, onde ela encontra a estátua da Pietà e faz uma aproximação óbvia entre a imagem da mãe do Cristo, o símbolo maior da devoção maternal no Ocidente cristão, e a imagem da Mamãe desaparecida, que, a esta altura, nós leitores sabemos morta, pois um dos capítulos do livro se dedica a um momento de transição do espírito de Park So-nyo entre a vida e o mundo espiritual. Ali, a filha mais velha expia simbolicamente o mal-estar, a dor e o luto de todos da família pela perda da mulher que, como Maria, abrira mão de viver suas vontades para dar vida aos sonhos dos filhos e aos caprichos do

 

marido. O epílogo é longo e fraco, porque o símbolo é por demais óbvio e repete muito dos sofrimentos vivenciados por todas as personagens desde o fatídico dia do desaparecimento de Mamãe. A frase final, que dá título ao romance, sintetiza a entrega de Chin do espírito de sua mãe nas mãos da mãe cristã, imagem modelar da maternidade – paralelamente, o próprio espírito de Mamãe se entrega ao espírito de sua mãe biológica, que vem buscá-la depois de sua despedida virtual de seus amores no mundo material. Contudo, a chave para o romance é perceber que a morte, ainda que simbólica para sua família (que, ao término da obra, não sabe que ela morreu), de Park So-nyo não se dá quando ela desaparece, mas alguns anos antes de sua perda na estação de trem.

A sagacidade formal deste melodrama é a polifonia dos narradores, pois a história nos é narrada pelos filhos Hyong-chol (o primogênito), Chin (a filha mais velha, escritora), pelo marido e pela mãe propriamente dita, que dedica muito de seu monólogo interior a analisar a condição de vida de figuras secundárias de sua família, como a caçula e a cunhada, além de sua paixão proibida, um vizinho que ela conhece por casualidade, mas com quem mantém uma relação emocional de décadas. A mãe, ao ser tratada pelos familiares, como aquela que naturalmente se dedicava aos afazeres domésticos e era a mãe e a esposa de alguém, a mantenedora financeira, a estimuladora geral, é esquecida em sua singularidade, pois ninguém se ocupava de verdade de Mamãe como uma pessoa. Alocada em suas funções sociais, o indivíduo Mamãe é coisificado e inservível quando a velhice lhe estanca as forças. O desprezo dos filhos é a lógica capitalista internalizada: sem força de trabalho, o ser humano é descartável. Ninguém na família, nem mesmo o filho mais velho, sobre quem Mamãe nutrira grandes esperanças de brilhantismo profissional, cumprira suas promessas de cuidado e conforto da mãe na terceira idade dela. Em uma passagem, as irmãs, ao trocarem impressões sobre um traço singular da mãe que as tivesse marcado, não sabem o que dizer uma a outra. Ninguém conhecia a mãe bem, embora ela conhecesse muito de todos. Ela era uma árvore de raiz bem fincada na terra, como o pé de caqui que presenteara à filha mais nova, em uma metáfora sobre a solidez de caráter da mãe. Nem por isso os filhos a respeitavam como sujeito e seu sumiço detona as mais fundas lembranças de como ela era única (como todas as mães, aliás) e de como ninguém lhe dedicava tempo suficiente. Essas observações dos filhos são uma crítica clara ao peso que os pais idosos se tornam para filhos em plena força produtiva e vigor físico, com carreiras consolidadas e famílias em construção.

Para traçar o perfil materno, Kyung-sook Shin emprega o recuso do foco narrativo em terceira pessoa para personagens que estão falando de si mesmas. Com essa manobra, é como se a personagem cuja voz ouvimos se mirasse com uma lupa e fosse direcionada ao escrutínio da observação indireta, que lhe aponta defeitos e qualidades na condução das consequências do conflito (o desparecimento de Mamãe). A primeira pessoa só é assumida pela figura de Park So-nyo, que, pela primeira vez, assume a narração pessoal de sua existência, já que até então nos fora apresentada pelo olhar de terceiros (curiosamente, o que só acontece depois de sua morte). Através de seu monólogo interior, conhecemos a misteriosa figura de Lee Eun-gyu, o tal vizinho, “companheiro ideal” da matriarca e arrimo emocional de Mamãe quando as tampas de potes não eram suficientes para acalmar as frustrações da vida. Essa personagem traz humanidade à personagem principal, projetada para ser uma figura quase sacrossanta, ideia reforçada pelo epílogo de cariz católico.

 

O romance é também o retratado de uma Coreia do Sul que caminhou, na segunda metade do século XX, tal qual o Brasil, outro país emergente, de uma sociedade rural e tradicional para uma nação urbana e cosmopolita. A pobreza vivida pela família nos primeiros anos de casamento dos pais, seguintes ao conflito entre as Coreias (e que impediram Kyun, o cunhado, de prosseguir os estudos por falta de dinheiro para arcar com os custos de manutenção na escola), é superada pelos filhos, que se tornam cidadãos de classe média alta em Seul. Contudo, a ocidentalização dos costumes e a adesão à globalização cobra seus preços à tradição local. O abandono sistemático dos coreanos do culto anual aos ancestrais, prática milenar, é a medida da uniformização praticada pelas forças do capital, que negligenciam o particular em nome de um modo de viver único entre os países do globo, algo que, simplesmente, não existe.

A despeito da forte carga emocional que o livro carrega, com um retrato pungente sobre a relevância da mãe dentro da estrutura familiar, é um romance que, assim como “A vegetariana” de Han Kang, pinta um retrato de mulher contemporâneo no perfil patriarcal do ambiente sul-coreano. Nenhuma das filhas de Mamãe ambiciona seu retrato de mulher – mãe em tempo integral, mulher profissional e eroticamente anulada. A mais velha sequer se casou e a mais nova, apesar de ter três filhos, percebe que a vida é mais do que a maternidade e pretende voltar a trabalhar tão logo seu bebê, o caçula de seus filhos, tenha crescido. A figura de Mamãe terá sido a última na família a encarnar o papel da mãe de comercial.


 모성애를 과연 측정할 수 있을까? 자식을 사랑하고, 자신을 부정하고, 자신을 포기하는 것도 모성 의 한 부분일까? 가족 내에서 어머니가 가지는 상징적인 위대함과 한 인간으로 가지는 자유로운 존 재로서의 어머니란 무엇일까? 작가 신경숙의 작품인 『엄마를 부탁해』는 서울역에서 남편 곁을 떠나 다가 길을 잃어버리고 결국 서울 거리를 헤매 다니는 주인공, 어머니의 여정 이야기이다.

 어머니의 실종사건은 모두의 기억을 되살려주는 방아쇠 역할을 한다. 기억이 바로 이 책의 또 다른 주인공이라 할 수 있다. 주인공인 어머니는 가족의 원동력이며, 우리가 소설에서 만나게 될 인물들 에게 ‘자유’를 선물하는 존재이기도 하다. 정이 담긴 기억마다 항상 그녀가 존재한다. 보잘것없는 아 버지는 자신이 마음 가는 대로 집을 떠나 다른 여성과 만나기도 하며, 심지어 내연녀를 감히 집으로 데려와 아내를 내쫓기도 한다. 그러나 어머니의 삶의 열정과 낙관적인 성격이 다른 가족들에게 희 망을 안겨준다. 가족들의 기억으로는 어머니가 어떤 질환을 앓고 있다고 알고 있다. 정확하게 밝혀 지지는 않지만 치매 증상이라는 것은 짐작할 수 있다. 이야기의 배경은 6·25 전쟁 이후 한국사회의 가족 구조와 체계를 중심으로 지난 50년 동안을 다루고 있다. 주요 인물인 어머니는 가벼운 뇌졸중 과 기억 상실로 그녀 자신은 물론, 그녀의 가족과도 이별하게 되는 기막힌 이야기이다. 가족들은  그녀의 실종을 통해 그녀가 죽었는지 살았는지 모르는 상태에 빠지면서 그녀의 삶을 더 정확하게 바 라볼 수 있게 된다. 자기 자신을 완전히 배제하고, 가족을 돌보는 데 헌신한 삶을 말이다. 특히 자식 들을 위해 희생하였고, 아내의 보살핌에 온전히 의지하는 쓸모없는 멍청한 남편을 돌봤다. 그는 스 스로 밥 한 번 차려본 적이 없는 그런 못난 사람임에도 말이다.

 이 책은 한국 여성의 역할을 조명하고 있다. 끝부분에서, 딸의 바티칸 여행이 어머니에 대한 가족 들이 느꼈던 죄책감과 경멸감을 요약해준다. 그곳에서 그녀는 피에타의 동상을 발견하고 서구 기독 교에서 가장 중요한 모성 신앙의 상징인 그리스도 어머니의 형상과 어머니를 비교하는데, 이미 우 리는 사라진 엄마는 이 세상을 떠난 것으로 알고 있다. 이미 주인공인 어머니가 이 세상에서 영적 세 계로 넘어가는 과정을 설명했기 때문이다. 그곳에서 딸은 마리아처럼 자녀들의 꿈에 생명을 부여하 기 위해 또한 남편을 위해 자신을 버리고 자신의 의지대로 살기를 포기한 어머니를 떠올리며 가족 이 느끼는 불편함, 고통, 슬픔을 상징적으로 표현한다.

에필로그는 길고 약하다. 상징적인 부분들이 너무 뻔하고 어머니의 실종 이후 모든 등장인물이 겪 는 고통을 계속 반복하기 때문이다. 소설의 제목인 마지막 문장은 마리아에게 어머니의 영혼을 바 치면서 하는 부탁이다. 동시에 어머니도 자신의 영혼을 바친다. 이 부분은 그녀가 이 세상과 작별을 고한 후에 일어난다. 그러나 이 소설의 핵심은 죽음이 그녀의 가족(책 말미에 그녀가 죽었다는 사실 을 알지 못함)에게 그녀가 사라질 때 발생한 것이 아니라, 그녀가 실종되기 몇 년 전 기차역에서 일 어났다는 것이다.

 이 책의 재미있는 점은, 등장인물인 장녀, 장남, 남편, 어머니가 자신의 이야기를 들려준다는 것이 다. 특히 어머니의 독백에서는 막내딸과 시누이의 관계, 이웃 남성과 수십 년 동안 맺어온 정서적인 관계에 대해 알 수 있다. 어머니는 가족을 위해 당연히 가사에 헌신했고, 누군가의 어머니이자 아내 로만 존재했다. 가족 중 누구도 그녀를 하나의 인격으로 대해준 적이 없다. 세월이 흐르면서 쇠약해 진 어머니는 쓸모없는 존재가 된다. 자식들의 마음속에는 노동력이 없는 인간은 처분할 수 있는 존 재라는 것과 같은 자본주의 논리가 내면화되어 있었다.

가족 중 누구도, 심지어 어머니가 모든 것을 다 바쳐 헌신하며 큰 희망을 품고 키운 장남조차도 노 년에 행복하게 해주겠다는 약속을 지키지 못했다. 자매들에게 어머니의 독특하고 뚜렷한 특징을 이 야기하라고 했을 때 누구도 무슨 말을 해야 할지 몰랐다. 그녀는 모든 사람에 대해 잘 알고 있었지만, 아무도 그녀를 잘 알지 못했다. 그녀가 막내딸에게 준 감나무처럼 땅 깊숙이 뿌리를 내린 나무 처럼 그녀는 강하고 확고한 성품을 가졌다. 그런 이유 때문은 아니지만, 자녀들은 어머니를 한 사람 으로서 존경했다, 특히 그녀가 사라진 사건을 통해 어머니가 얼마나 독특한 분인지를 알게 되고 그 동안 아무도 그녀와 충분한 시간을 함께한 적이 없다는 것을 알게 되었다. 이런 맥락에서 경제적 활 동이 활발하고, 자신들의 가정을 꾸려가야 하는 자녀들에게는 노부모를 돌봐야 하는 부담감을 당연 히 이해할 수 있다.

작가는 주인공을 소개하기 위해 삼인칭 관점으로 접근한다. 이것은 마치 캐릭터들이 자신을 돋보 기로 바라보면서 자신의 결점과 자질을 지적하고 간접적으로 관찰하고 분석하는 느낌이 들었다. 박 소녀는 1인칭 시점으로 자신의 존재를 처음 알리고, 그 이후 타인의 눈을 통해서만 소개된다. (그 녀가 죽은 다음이라는 것이 흥미롭기도 하다.) 그녀의 독백을 통해 ‘이상적인 동반자’인 이은규라 는 인물도 있다. 정서적으로 힘이 되어주는 인물이고 그녀의 이웃이다. 또 그녀의 좌절감을 없애주 는 인물이다. 이 캐릭터는 신비롭다고 해도 과언이 아니며, 가톨릭 에필로그에서 이런 인상이 더 강 화된다.

 이 소설은 신흥국인 브라질처럼 20세기 후반 한국의 모습을 잘 묘사하며, 농경 사회에서 현재 세 계대동주의적 민족국가 되는 그 과정을 잘 설명한다. 부모님이 결혼한 후 겪는 가난, 남북한 간의 갈 등에 뒤이어 (시동생 견이가 학비를 감당할 돈이 없어 학업을 포기하는 이유) 가족이 서울에서 자리 잡아 중상류층에 오르게 되는 과정을 통해 잘 보여준다. 하지만, 서구화된 관습과 세계화에 대한 사 람들의 집착은 지역 전통에 큰 피해를 주기도 한다. 예를 들어 한국 사람들이 제사 같은 고대 의식 을 포기하는 데 자본주의가 큰 역할을 한다. 그들은 세계화된 국가들 사이에서 독특한 삶의 방식이 지만, 사실은 독특한 삶이라는 것은 존재하지 않는다.

 책이 담고 있는 강렬한 감정적 부담과 충격을 무시할 수는 없지만, 어머니의 역할, 의미, 중요성을 아주 잘 그려냈으며, 한강의 「채식주의자」처럼 가부장적 측면에서 동시대 여성의 모습을 그려냈다. 딸들은 어머니가 살아온 여자로서의 길을 거부한다. 장녀는 아직 미혼이며, 막내딸은, 세 자녀의 엄 마이지만 아이들이 조금만 더 자라면 최대한 빨리 직장에 복귀하고 싶어 한다. 우리가 드라마에서 접하는 그런 엄마의 모습은 이제 어머니에게만 남아 있다.



Keyword : Por Favor Cuide da Mamãe,Kyung-Sook Shin,Please Look After Mom,2021 Korean Literature Review Contest,Juliana Berlim

Book's Info
Por Favor, Cuide da Mamãe
  • Por Favor, Cuide da Mamãe
  • Author : Kyung-Sook Shin
  • Co-Author :
  • Translator : FLAVIA ROSSLER
  • Publisher : Intrinseca
  • Published Year : 2012
  • Country : BRAZIL
  • Original Title : 엄마를 부탁해
  • Original Language : Korean(한국어)
  • ISBN : 9788580571325
Author's Info
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Shin Kyung-sook
Original Work's info
Please Look After Mom
  • 엄마를 부탁해
  • Author : Kyung-Sook Shin
  • Co-Author :
  • Publisher : 창비
  • Published Year : 0
  • Country : 국가 > SOUTH KOREA
  • Original Language : Korean(한국어)
  • ISBN : 9788936433673

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