Só somos livres quando nos amamos: uma resenha crítica do livro “Por Favor, cuide da mamãe”
2021 Korean Literature Review Contest
by Mariana Vieira Moura , on September 13, 2022
- Portuguese(Português)
- Korean(한국어)
Escrevo esta resenha após um Dia das Mães ausente. Faz cinco meses que iniciei minha jornada solitária morando em um apartamento na cidade de São Paulo. A pandemia não me deixa ver minha mãe. Enquanto ela está no lado dourado do país, cheio de coqueiros e maresias, e onde a pandemia tem sido mais ou menos controlada, eu estou na cidade que virou um cemitério vivo. São Paulo soa como um cemitério que grita, em brasa. O que me reanima são meus livros enfileirados na estante, que funcionam como minha mesa de santos. São minha segurança. Quando toquei no livro de Kyung-sook Shin, senti que seria difícil. Uma história de uma mãe desaparecida em um ano tão doloroso. Seria uma facada. E na primeira leitura, foi. Porém, na segunda, eu entendi a beleza do livro, consegui me enxergar na filha escritora e entender também o que fez florescer a maior liberdade na qual vivo, a possibilidade de ter saído da minha cidade natal e ido viver meu sonho. Aos leitores que também vivem em uma solidão do novo e em uma descoberta de novas galáxias, espero que ao terminar esse livro possam ver que há uma rede que sustenta nossos corpos suspensos no céu. Uma rede costurada de pessoas que constroem nossa liberdade.
A história tocante criada por Kyung-sook Shin, autora do best-seller sul- coreano Por Favor, cuide da mamãe1 começa a firmar suas delicadas garras no coração do leitor com a narração de uma escritora, Chi-hon, que está desesperada à procura de sua mãe, Park So-nyo. A narrativa inicia-se com a escritora e, posteriormente, vamos conhecendo os outros filhos de Park e o seu marido, com um capítulo destinado à perspectiva de cada um. A mãe desaparece no metrô da estação de Seul, ao perder- se do marido.
Os familiares da matriarca sumida possuem sua voz em segunda pessoa, ou seja, só se referem a si mesmos com “você̂ ” ou “tu”, à exceção do filho mais velho. O leitor sente na pele como se fosse um familiar egoísta que pouco sabe sobre sua própria mãe. Você̂ não pode negar, você̂ só́ pode se deparar com acusações sobre quem você̂ é. Você̂ não sabe a idade da sua mãe. Você̂ não sabe quando começou a perceber que sua mãe não sabia ler. Também não sabe quando as dores de cabeça dela começaram. Você̂ pouco também reconhece todo o sacrifício da sua mãe para que seus filhos fossem espíritos livres.
Para entender a liberdade que Park So-nyo entrega para seus filhos, pode-se pescar uma memória de Chi-hon, a escritora. Em um passado de escassez durante a época de crise pós-guerra coreana2, a menina pede um livro de presente à mãe. O livro era intitulado: “Humano, demasiado humano”3, escrito pelo filósofo cético Friedrich Nietzsche. Esse livro, como bem Nietzsche detalha, é destinado aos espíritos livres: “uma coisa une e distingue todos os meus livros (...): todos eles contêm (...) redes para pássaros incautos” (NIETZSCHE, 2005, p.5)
Tal livro presenteado versava sobre a quebra das tradições e advogava que o caminho do conhecimento envolvia uma visão da vida que quebrasse os costumes e as morais pré-estabelecidas. Porém, mesmo esse sendo o único presente da mãe, um livro do mesmo autor de “O Anticristo”, a narrativa surpreendentemente termina com Chi-hon (a presenteada) rezando no país mais católico do mundo, o Vaticano, com um rosário feito de pau rosa. Para começarmos a entender a lógica sequencial de tais cenas contrastantes, apresentadas entre o início e o término da narrativa, devemos notar que a coerência está justificada pelo símbolo do rosário de pau rosa, apresentado na história.
Com efeito, após citarmos a relação inicial de contradição entre a oração e o livro, devemos focar no rosário de pau rosa. Esse artefato funciona como uma arma de Tchekhov. Tal artifício literário, criado pelo escritor russo, determina que quando há uma pistola no livro, em um momento terá́ que ser puxado o gatilho, pois tudo que está presente no texto tem um motivo. Na trama, a preparação do gatilho foi pelas mãos da própria Park So-nyo. “Qual é o menor país do mundo? Mamãe pediu que você̂ lhe trouxesse contas de rosário rosa se alguma vez fosse a esse país.” (p.38). A mãe justificou: “Porque você pode ir a qualquer lugar” (p.39). A mãe gostaria de receber o rosário como um presente, um símbolo da emancipação da filha. O conhecimento e o progresso da filha
possibilitaram essa liberdade. Portanto, Chi-hon poderia ir a qualquer país, graças a essa possiblidade. De fato, essa questão da emancipação pelo conhecimento que o livro revela possui raízes na história de soerguimento econômico da Coreia do Sul pelo investimento em educação.4
Além do conhecimento, esse livro também falará da importância do afeto e das conexões humanas que possibilitam as condições para o progresso real de um país. Devemos citar um trecho da entrevista da autora para entendermos melhor sua mensagem. Kyung-sook Shin, uma autora que nasceu perto de uma aldeia em Jeongup, na península sul-coreana, em 1963, possui diversos livros premiados e atualmente trabalha como professora convidada da Universidade Columbia, Estados Unidos. A autora, ao ser questionada em uma entrevista5 para a Korea Society, sobre o porquê do livro “Por Favor, cuide da mamãe” tornar-se premiado (ganhador do prêmio Man Asian Literature) e sucesso em vendas no mundo todo, acertadamente, indica:
De fato, como a autora aponta, a sensação de perda de compaixão familiar é um fator global, em que cada vez mais, no capitalismo, somos levados a um ritmo de produção e trabalho que nos afasta das relações de carinho e proximidade. A mãe torna-se, portanto, um arquétipo. Um arquétipo da compaixão e solidariedade. No livro, mesmo com os personagens que eram filhos dessa mãe prosperando economicamente, todos sentem em seu interior: “mamãe é a pessoa que você tem vontade de chamar toda vez que você se desespera com alguma coisa nessa cidade” (p.17).
Como bem visto no texto de Shin, esse chamado desesperado para o arquétipo do cuidado e da solidariedade está permeado de sentido por meio do ato da leitura. De fato, a emancipação por meio do estudo e do conhecimento só foi possível graças ao esforço da mãe. Quem materialmente levou esses espíritos a serem livres foram os gritos e sacrifícios de Park So-nyo: “Do que adianta ter uma casa se você não pode sequer mandar seus filhos à escola? Eu devia quebrar tudo!” (p.34). Essa fala foi feita para exigir que a filha escritora conseguisse ir para a escola e também que aprendesse a ler. Se não houvesse leitura nem escola, não existiria escrita.
Ademais, não foi somente para essa filha que a mãe lutou para que houvesse os louros do conhecimento. Apesar de ser analfabeta, a mãe lutou para que todos os membros da sua família estudassem. O sonho para seu filho, Hyong-chol, era que fosse promotor público e quando ele desistiu de tal objetivo e conseguiu um cargo em uma empresa, ela perguntou: “ O que aconteceu com o que você pretendia ser?” (p.77). Também havia uma filha, Yun, que tinha se estabelecido como dona de casa, com três crianças. A mãe fez questão de levá- la para o jardim primário determinada a aprender a escrever o próprio nome junto com a filha. Antes, com seus outros filhos, nunca havia conseguido acompanhá- los à escola. Em relação a essa filha, quando ela cresce e se estabelece como dona de casa, a mãe questiona: “como você consegue viver assim?” (p.150). O filho, por sua vez, reflete: “Mamãe, quando mais jovem, era uma presença que o incentivava a continuar construindo sua determinação como homem, como ser humano” (p.77).
No capítulo escrito pela perspectiva do marido de Park So-nyo, também descobrimos que a esposa cuidava também de sua comunidade e doava dinheiro para um orfanato. E inclusive prometia para um menino chamado Kyun, comprar uma pasta para livros e uniformes quando esse fosse para o ensino médio (p.100). Se a questão do investimento na educação já aparece claramente, ainda nos deparamos com um dos fatos mais melancólicos do livro. O suicídio do cunhado de Park So-nyo, também (coincidentemente) nomeado de Kyun que se suicidou após uma vida assustadora na cidade grande na qual nunca conseguiu realizar seu sonho, o de estudar no ensino médio. Quem incentivou e lutou para que ele se formasse foi a própria Park So-nyo, que insistiu que, para levá-lo para escola, vendessem o jardim (p.127).
E por fim, também descobrimos que a mãe estava aprendendo a ler e o livro que fazia questão de ler era o livro escrito por sua filha. De forma emocionante, a contradição entre os espíritos livres nietzschianos e o teor cristão do final da trama perde toda sua oposição: somente com o afeto, os espíritos se libertam. A leitura e o aprendizado no livro todo foram regidos pelo afeto. A arma de Tchekov do livro, o rosário de pau rosa, que recebe inclusive o título de epílogo (p.179), fecha todas as pontas soltas. O livro termina em oração com a peça dramática.
Em uma entrevista6 sobre seu livro novo, “Sociedade paliativa: a dor hoje”, o filósofo de origem sul-coreana, Byung-Chul Han, brilhantemente alerta: “Eu acredito que os seres humanos alcançam o auge da beleza quando oram. É por isso que gosto de ir às igrejas. Sem dor, não conseguirão orar”. De fato, em tal livro, o autor argumenta que as dores não serão curadas somente com hospitais. Essa sociedade somente busca métodos paliativos, quando a verdadeira cura está na solidariedade e no carinho. Não se podem enganar os sentimentos. Permitir-se sentir a dor e pedir ajuda, isso é o que realmente cura.
O mesmo autor, em seu livro “A agonia de Eros”7, argumenta que o amor se perde na individualidade. Em uma sociedade narcisista que não aceita o diferente, o Outro começa a sumir e não podemos viver a relação em si. Segundo o filósofo, o sujeito narcisista “não consegue estabelecer claramente seus limites (...) o mundo se lhe afigura como sombreamentos projetados de si mesmo. Ele não consegue perceber o outro em sua alteridade e reconhecer essa alteridade” (HAN, p.6).
Essa explicação torna mais clara a escolha de um capítulo para cada membro da família da mãe desaparecida. Cada um possui um fragmento de história da mãe, mas não conseguem delimitar exatamente quem é essa mulher (nem o ano de seu nascimento exatamente o sabem). Nesse ponto, até a mãe começa a se esquecer de si mesma; com uma hemorragia cerebral, aos poucos seu cérebro vai destruindo a sua identidade, mas não consegue pedir ajuda e se recusa a ir para o hospital. Seu maior ponto de apoio, um amor secreto, ela desiste de procurar. Desse modo, não resta nenhum Outro para que a mãe pedisse ajuda.
A mãe decide destruir seus próprios pertences e ir sumindo aos poucos, até sua cabeça a destruir. As perguntas que ficam: será́ que ela teria ido ao hospital se os seus filhos tivessem decidido acompanhar seu ritmo? Se andassem um pouco mais devagar? Se a mãe pudesse falar tudo que estivesse na sua cabeça? Essa é a pergunta que o marido se faz. “Você até parava e esperava por ela, mas nunca caminhou ao seu lado, conversando com ela, como ela queria, nem uma vez sequer.” (p.117)
De fato, esse livro nos lembra que o desenvolvimento só existe com solidariedade. Só existe com as pessoas que nos incentivam. Dessa forma, entende- se mais profundamente o final do livro, com o epílogo por conta da escritora, orando por sua mãe. Como Nietzsche declamou: “Um bom escritor não tem apenas o seu próprio espírito, mas também o espírito de seus amigos” (NIETZSCHE, 2005, p.76.)
어버이날을 놓친 후 리뷰를 쓰게 되었다. 상파울루 아파트에 혼자 살면서 외로운 여정을 시작한 지 이제 5개월이 되었다. 코로나로 인해 어머니를 못 만나고 있다. 어머니는 코코넛 나무와 습지로 가 득한 우리나라에서 가장 아름다운 지역에 계시는데 다행히 그 지역은 방역관리가 잘 이루어지고 있 다. 도시 생활은 거의 묘지에서 사는 기분이다. 상파울루가 말 그대로, 불타면서 비명을 지르는 묘 지인 것 같다. 기분 전환으로는 책꽂이에 있는 책을 보는 것이다. 그것은 나에게는 매우 소중한 것 이고, 마음을 편안하게 해준다. 신경숙의 책을 처음 봤을 때는 너무 어둡다는 느낌을 받았다. 그렇게 고통스러운 해에 실종된 어머니의 이야기는 날카로운 것에 찔리는 듯한 느낌이었다. 그러나 두 번 째 이 책을 읽었을 때 내용의 아름다움을 이해하게 되었고, 딸을 통해 저 자신을 볼 수 있었고, 저의 경우에는 고향을 떠나 제 꿈을 실현할 기회가 있다는 생각이 들었다. 삶의 자유라는 것이 무엇인지 이해할 수 있었다. 새로운 세계를 발견하기 위해 외로운 여정을 걸어가는 사람들이 이 책을 읽은 후 저 너머 하늘에는 자신을 지지하는 완전히 새로운 세계가 있다는 것을 알 수 있기를 바란다. 자신의 자유로운 삶을 만들어 가는 사람들의 네트워크 말이다.
신경숙의 『엄마를 부탁해』1)는 엄마 박소녀를 필사적으로 찾는 딸의 목소리를 통해 독자에게 감동을 선물한다. 이 작품은 다층적 담화를 형성하는 복수의 화자와 수화자 기법이 등장하며 처음에는 작가의 입장, 다음은 딸의 입장, 어머니 자신, 아버지 등이 있다. 별도의 장에서는 각 캐릭터에 대한 관점을 설명하는 데 전념한다. 어머니는 서울역 지하철에서 남편 곁을 떠나 사라지게 된다.
장남 외, 실종된 분의 가족은 2인칭으로 등장하고 화자가 마치 독자인 내 앞에서 말하고 있다는 착 각이 들고 가슴으로 다가온다. 독자는 자신이 어머니 캐릭터에 대해 거의 알지 못하는 이기적인 친 척처럼 느껴진다. 아무것도 부정할 수 없이 그저 비난을 받아들여야 한다. 어머니가 몇 살인지 모른 다. 어머니가 글을 읽을 수 없다는 것을 언제 알게 되었는지 모른다.
그녀의 두통이 언제 시작되었는지도 모른다. 어머니가 자녀들이 자유로운 영혼으로 살아갈 수 있 게 희생한 것도 몰랐다.
박소녀가 아이들에게 선물한 자유를 이해하려면 지은이의 기억에서 찾아볼 수 있다. 전쟁 후 넉넉 하지 않은 삶을 살았고2) 아이는 어머니에게 선물로 책을 사달라고 한다.
회의적인 철학자 프리드리히 니체가 지은 그 책의 제목은『인간적인, 너무나 인간적인』3) 이다. 니체 가 설명하듯이 이 책은 자유로운 영혼을 위한 것이다. “나의 모든 책의 공통점은: 모든 책에는 … 부 주의한 새를 위한 그물이 들어 있다. (『NIETZSCHE』, 2005, p. 5)”
이 놀라운 책은 전통을 깨는 것에 관한 것이었고, 지식을 얻는 유일한 방법은 미리 확립된 관습과 도덕을 깨는 것이라고 주장했다. 이게 엄마가 준 유일한 선물이었다. 천주교가 태어난 나라 바티칸 에서 딸이 자단으로 만든 목주를 들고 기도하는 곳에서 이야기가 끝난다는 것이 놀라울 따름이다. 비록 시작과 끝이 대조적인 것은 이해하기가 어렵더라도, 우리는 상징으로써 묵주를 통해 이야기를 더 잘 이해할 수 있다.
일단 묵주에 집중할 필요가 있다. 이것은 체호프의 무기로 작동한다. 러시아 작가가 만든 그러한 문학적 기교는 책에 권총이 있을 때 어떤 시점에서 방아쇠를 당겨야 한다고 말한다. 왜냐하면, 내용 의 모든 것에는 다 이유가 있기 때문이다. 극 중 방아쇠를 당길 수 있는 사람은 박소녀 자신이었다.
Keyword : Por Favor Cuide da Mamãe,Kyung-Sook Shin
- Por Favor, Cuide da Mamãe
- Author : Kyung-Sook Shin
- Co-Author :
- Translator : FLAVIA ROSSLER
- Publisher : Intrinseca
- Published Year : 2012
- Country : BRAZIL
- Original Title : 엄마를 부탁해
- Original Language : Korean(한국어)
- ISBN : 9788580571325
- 엄마를 부탁해
- Author : Kyung-Sook Shin
- Co-Author :
- Publisher : 창비
- Published Year : 0
- Country : 국가 > SOUTH KOREA
- Original Language : Korean(한국어)
- ISBN : 9788936433673
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